segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Eleições


Já era de noite em  São João dos Angolares, na costa leste da ilha de São Tomé, distrito de Caué.

Noite cerrada, quase sem lusco-fusco. Eu vinha do lado da capital, Cristopher do interior, da mata, esteve todo o dia a fotografar insectos, e nem se apercebeu que naquele domingo tinha sido as eleições. Mas sobre Cristopher, filósofo Holandês, partilho noutra altura.

As eleições em África é qualquer coisa de não descritível. É ir lá. E ver. Os cidadãos são premiados com dinheiro ou até motos, pelo voto. E quando vão votar levam um carimbo na mão, para que os apoiantes dos partidos saibam que aquela pessoa já votou e assim fazerem o que têm a fazer das piores maneiras.

É impressionante o quanto o iletrismo, é um factor importante para estes políticos, já dizia não sei quem, que o pior inimigo de um político é a sabedoria do povo. Fora da capital reina o iletrismo e todas as más consequências deste.

À medida que fui descendo aquela canada cor da terra que só África sabe ter… várias crianças vieram ao meu encontro, só queriam um abraço, um colo. É. Só queriam um colo. Passei o centro da vila com onze crianças. Uma em cada dedo da minha mão, e ainda uma outra agarrada à minha cintura. É provavelmente uma das melhores imagens e sentimentos que tenho das minhas viagens, e também, das minhas memórias. Porque são daqueles sentimentos que não se descrevem. Não há adjectivos. Léxico que chegue. Sente-se. E pronto. E basta.

Quando paramos na praça, um homem dos seus trinta anos, encostou uma arma à minha cintura e diz: “Só passas desta praça com vida, porque estás com as nossas crianças. Uma branca, sozinha aqui em dia de eleições. Ou não sabes o que se passa, ou estás a armar-te em valente.”

Eu sabia exactamente o que se passava. Mas arrisquei. Confesso, quando senti o cano da arma na cintura, tremi. Suei. Mas sorri e só disse. Estou na paz, só vim dar uns quantos abraços às crianças. Ele retirou a arma da minha cintura, colocou-a em cima do ombro e disse, tens uma hora para sair daqui. E eu tive mais um dia. Quem me deu almoço no dia seguinte? A família desse homem. A vida tem coisas fantásticas. Não tem?

[ No clicar, algumas das onze crianças]

[Mãe, se leste este post, desculpa qualquer coisa, mas eu gosto é de viver assim]

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